quinta-feira, 28 de agosto de 2008

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"Fico tão cansada às vezes, e digo para mim mesma que está errado, que não é assim, que não é este o tempo, que não é este o lugar, que não é esta a vida. (...)então eu não sentia nada, podia fazer as coisas mais audaciosas sem sentir nada, bastava estar atenta como estes gerânios, você acha que um gerânio sente alguma coisa? quero dizer, um gerânio está sempre tão ocupado em ser um gerânio e deve ter tanta certeza de ser um gerânio que não lhe sobra tempo para nenhuma outra dúvida..."

Caio Ferando Abreu

3 comentários:

Anônimo disse...

Variações sobre um tema banal

I

Não te esqueças que a vida é um momento que voa
um efêmero instante de beleza e alento;
vive pois sem temor e com desprendimento
o que ela te ofertar, sem maldize-la à-toa!

E' uma nuvem que muda aos caprichos do vento!
Se hoje a perdes... O tempo nunca te perdoa!
Vida! Repara bem como a palavra soa!
Não temas pronunciá-la com deslumbramento!

Há alguém, não sei quem é, mas disto estou seguro,
que nos há de intimar num remoto futuro
a dar contas da vida que um dia ganhamos...

E após tal julgamento estranho, com certeza
havemos de sofrer e pagar, se em defesa
não der-mos as razões porque a desperdiçamos...

II

O que a vida te der, seja migalha embora,
se é migalha de amor, de prazer, de alegria,
- colhe-a! que esta migalha é o pão de cada dia,
e há de um dia chorar quem hoje a jogar fora!

Quem muito quer, despreza o pouco, sempre chora,
ou quem indiferente segue, de alma fria,
há de um dia parar e há de lembrar-se um dia
do clarão que se foi numa longínqua aurora!

Então, nada haverá... nem mais frutos nos ramos
nem migalhas de amor - se outrora as desprezados,-
e a indiferença de ontem sofre arrependida...

E ante a sombra que vem velar nosso desgosto
procuramos em vão uma aurora perdida
na luz que desespera e morre num sol-posto!

III

Hás de te arrepender sempre tarde demais
dos momentos de amor ou de puro prazer
que com medo talvez, não quiseste colher
e ficaram em branco ... inúteis, para trás ...

Vive com todo o ardor de que fores capaz
e a essa paixão entrega, em êxtase, teu Ser.
Ah! bem pior do que a dor vivida, podes crer,
é a dor de não poder vivê-la nunca mais!

Não receies sofrer, que é vida o sofrimento.
Receia, e com razão - cada dia perdido
sem que o amor te arrebate ou te perca um momento.

De nada há de servir-te o desespero teu,
pois mais vale chorar o amor que foi vivido
que lastimar o amor que um dia se perdeu!

IV

Quantas vezes já ouvi dizer amargamente
quando a noite do tempo chegou sem alarde:

"só agora depois que o coração não arde,
não arde o coração... e a alma já não sente...
- vejo, quanto perdi, irremediavelmente,
por ter sido na vida, um tímido, um covarde!
Ah! se pudesse ser o que fui, novamente!"

Quantas vezes já ouvi dizer... mas muito tarde...


Sofrimento absurdo esse arrependimento
de tudo ter podido alcançar num momento
e tudo ter perdido sem erguer a mão...

E abatido ir sentido a invasão desse tédio
que vai enregelando aos poucos, sem remédio:
a alma, o sonho, a esperança, a vida, o coração!

V

Antes se arrepender do que se fez um dia
por sincero prazer pondo tudo de lado,
do que o arrependimento de se ter deixado
de fazer, por temor... - se o coração pedia.

Se colheste a emoção com intensa alegria
e se foste feliz e marcaste o passado,
bendiz esse segundo ou essa hora, - esse dia
em que o mundo foi teu, vencido e conquistado...

A vida é uma aventura e é preciso vivê-la!
Nada há que justifique uma abstinência ao mundo,
- ergue a mão para o céu e colhe a tua estrela!

E' a hora do Natal... A estrela é o teu presente!
Mesmo que ela cintile apenas um segundo,
contigo hás de levá-la indefinidamente...

VI

Escreve com teu sangue o teu próprio romance
enche-o com teu amor, misto de sonho e vinho,
mais vale ter no peito enterrado um espinho
depois - que a solidão até onde a vista alcance...

Sofrimento é afinal perceber, de relance,
que já estamos ao fim de um imenso caminho
e que tudo que esteve um dia ao nosso alcance
passou... E olhar em torno, e se sentir sozinho...

Não, não tentes voltar, porque a vida não volta...
Jogarás contra o vento a angústia e o desespero
e em espumas verás tua inútil revolta. . .

Vive, pois... E se assim te falo, e isso te digo,
é que poderás ver no instante derradeiro
que se a vida foi vã a memória é um castigo!

( JG de Araujo Jorge em " Concerto a 4 Mãos" - 1961 )

Maressa disse...

Dear anônimo (a),

Belo poema de JG de Araujo Jorge. So que insistentemente pedagógico!

AS variações são bem-vindas! Assim como o senhor(a).

abraços

Anika disse...

As vezes eu preferiria ser um geranio.